terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Hospício é Deus

"Sebastião de França dizia-me:'-Você chega a ser selvagem, tão grande é a sua timidez.' Não é exatamente timidez. Prefiro considerar como sendo minha predileção pelo essencial. Se falo mais do que costumo permitir-me, faço-o na tentativa de perder-me. Sinto-me logo cansada, além de envergonhada. Apesar de ser a maneira considerada normal. Todas as pessoas minhas conhecidas agem assim. Como são dispensáveis, quase sempre. Gostaria de matar todas as pessoas, de vez em quando, ver-me livre, e ressuscitá-las, também de vez em quando. Não me agrada estar comprometida com alguém constantemente, ou com alguma coisa. Faço literatura se desejo, não possuo disciplina, ignoro esquema de trabalho, abomino que me imponham deveres para com as coisas que me agradam. Venho sozinha para o hospício; se me obrigassem, lutaria com todas as minhas forças para não vir. Naturalmente faz parte da minha esquizofrenia esta maneira de ser. E a maneira de ser deles deve fazer parte da sua mediocridade. Percebo certa imoralidade na luta que caracteriza certas pessoas para conseguirem um lugar no mundo. Que falta total de pudor – como se esforçam. Ainda têm coragem de dizer que nesta luta está o valor. Quanto a mim, sou demais orgulhosa para lutar. Tudo me vem por acidente.”

O fragmento acima foi extraído do livro "Hospício é Deus", da escritora mineira Maura Lopes Cançado. Entre tantos trechos memoráveis do diário dessa mulher extraordinária, escolhi publicar (ainda não me habituei ao verbo postar!) este porque o considero uma síntese de um pensamento que sempre me assalta.

Não sou orgulhoso demais para lutar; sou apenas incompetente. Ademais, não tenho saco pra ler livros de autoajuda e não sou religioso. Sou só um desempregado, porra! Um cara de vinte e quatro anos que se esforça para acreditar que sua vida ainda não começou, mas que o começo está próximo.

“Muito cedo na minha vida ficou tarde demais. Quando eu tinha dezoito anos já era tarde demais.”

Espero que esta frase, que marca o início do livro “O Amante”, de Marguerite Duras, não se aplique à minha sina.

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