quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Confissões de ano velho I

No início de 2009, eu era um ser errante, algo patético, sem ocupação nem perspectiva. Enquanto aguardava a possível confirmação do pouco de talento que havia algum tempo acreditava ter, resolvi criar este blog para me distrair. Em março essa confirmação veio na forma de um reconhecimento por parte do júri do maior prêmio literário para autores estreantes do país. Embora meu livro não tenha sido o vencedor da categoria romance, a menção honrosa que lhe foi concedida insuflou algum ânimo em meu espírito e me incentivou a continuar escrevendo. Não que agora eu tenha plena certeza de que nasci para ser escritor; não se trata disso. Aliás, nunca fui possuidor desse tipo de convicção. Nunca me julguei predestinado a nada.

No entanto, eu continuei minha busca por ocupação. Vagava por Guaratinguetá e por cidades vizinhas à procura de emprego, preenchendo fichas, respondendo a perguntas de recrutadores psicólogos e psicólogos recrutadores; de baldeação em baldeação, com dinheiro contado, uma pastinha de plástico transparente ridícula debaixo do braço, distribuindo currículos e pequenas inverdades convenientes.

Às vezes enveredava por descaminhos francamente aterradores. Aceitava apadrinhamento de gente mau-caráter e fingia crer em doutrinas e métodos que sempre havia julgado ilegítimos. Numa dessas manhãs desesperançosas e aflitas, acabei indo parar num templo religioso do magnata ungido R.R. Soares, levado por um fotógrafo calhorda amigo do meu pai. Waldemar era um troglodita pio e desonesto, alguém com quem somente o biltre do meu pai poderia manter laços de amizade.

Na ocasião, assustado e vexado debaixo daquela cúpula azul celeste, ouvi a palavra do Senhor através da boca de um pastor com sotaque carioca que tinha pinta de pagodeiro. Enquanto o pastor Edmilson se preparava para derramar suas bênçãos sobre mim, Waldemar lhe fornecia informações a meu respeito e a respeito de minha família: o garoto está com um encosto tremendo e a família é assombrada por demônios: o pai é um bêbado, a mãe uma dona-de-casa infeliz, e a avó uma anciã enferma. Então o pastor pediu para que eu fechasse os olhos, erguesse os braços na direção do céu, e deixasse o Espírito Santo agir. E foi assim que este blogueiro ímpio acabou “curado” em nome de Jesus, do pastor Edmilson, de R.R. Soares, e do Waldemar, o fotógrafo.

2 comentários:

  1. Bruno ,sua vida é uma comédia!!!
    Para de ser depressivo e vai curtir a vida falando dessa maneira vc parece um velho de 70 anos.Beijos te

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  2. Teresinha, minha querida, a vida é triste, tristíssima mesmo, e por isso eu a encaro como uma comédia - do contrário seria muito difícil suportá-la.

    Não me acho depressivo, não; só um pouquinho cínico e pessimista. E quem me dera ser um velho de 70 anos.!

    Beijos. E volte sempre.

    P.s. – não acredite em tudo o que lê, baby. Todos os escritores são, antes de tudo, uns mentirosos.

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