sábado, 10 de janeiro de 2009

Notas perdidas

Algumas sábias e pungentes palavras do grande escritor americano Truman Capote, sobre o dom (de escrever):

“Quando Deus nos dá um dom, também dá um chicote – e esse chicote se destina exclusivamente à nossa autoflagelação”.

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Quantos contos ruins eu sou capaz de escrever até me dar conta de que meu talento é zero? Porra! Tenho que tomar uma atitude. Deixe estar. Deixe estar que amanhã é domingo e, se eu desejar, poderei até ir à missa. Que mais eu poderia querer? Escrever aquele conto sobre o filho que volta à cidade natal para procurar o pai alcoólatra que está sumido há dias. Esse filho que é acionado pela mãe desesperada, que vê nele a última salvação possível para o marido. Esse filho que vem de longe, duma cidade onde trabalha como guarda-noturno numa escola de idiomas, e põe-se a errar pela cidade de sua infância perdida, à procura daquele fantasma sem rosto, que já não representa mais nada pra ele. Esse filho que está prestes a completar trinta anos, e cujo sonho, já morto, era tornar-se cineasta. Esse jovem que deixou uma jovem namorada na cidade grande, e que tem medo de confrontar-se com o próprio passado, e de sucumbir ante o remorso por ter abandonado a mãe e o irmão à própria sorte, na companhia de um operário bêbado e arruinado cujo único propósito na vida é percorrer os bares da cidade em busca sabe-se lá de quê. E o título desse conto é Véspera.
26/12/2006
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Ontem jurei a mim mesmo que nunca mais caminharia sobre as águas. Que nunca mais cometeria perjúrio. E como é difícil manter minhas promessas. Também jurei que nunca mais escreveria poesia. A poesia fede, diz um personagem dum conto de Danton Trevisan – no extraordinário “Cemitério de Elefantes”. O mundo fede ao natural, mas a fedentina poética é muito mais nauseabunda. Ah, disso só os poetas sabem!
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Um homem pode perder a luta, mas nunca desistir da batalha. Ai, ai! Um homem sem coração. Vendendo queijos no centro da cidade ou fazendo a manutenção noturna dos trilhos do metrô. Um homem sem medo. Que não leva desaforo pra casa. Não. Um homem de verdade não leva desaforo pra casa. Assim como um homem nunca fica indiferente a uma mulher bonita. Não um homem de verdade. Esse mesmo homem que tem orgulho de se barbear pela manhã; que se regozija ao observar o jacto de esperma que acaba de verter para o nada, ou para dentro do ventre da mulher que o originou. Um homem vivo ou morto. A recompensa é a mesma. Desprovido ou pejado de desejo. Ele lavará seu carro no sábado à tarde. Mas ninguém poderá impedi-lo de se sentir só. Ninguém poderá ampará-lo quando do seu momento de ocaso. O homem acaba por ficar velho. Às vezes acontece num domingo, outras vezes numa sexta-feira. É uma coisa subjetiva. Tem a ver com sexo e metal retorcido, como todas as coisas. Tem a ver com as unhas das mãos. Um arco-íris que se borrou de cinza.
24/03/2007
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Consigo redigir mais de 600 palavras e fico feliz como uma criança que acaba de ganhar um brinquedo novo. Escrever ficção é como dragar um rio de águas turvas, com o perdão da comparação cafona.

Estamos vivendo tempos difíceis. De correria e incertezas. Alguns apelam à auto-ajuda e outros pedem pelo amor de Deus. Eu fico na corda bamba. Acho mais divertido. Sabe aquela coisa: tomar banho de esguicho e ficar alegre por pegar um resfriado? Tome-se como exemplo o suicídio coletivo cujos membros integrantes estão calçando tênis Nike. Sei lá. Às vezes, quando viajo de ônibus, fico pensando nessas coisas que quase ninguém pensa. Alguém tem de se ocupar delas. É como aquelas pessoas que defendem animais exóticos em extinção. Isso mesmo. Meus pensamentos enviesados são animas em extinção. E viva a metáfora barata!
29/03/2007

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