domingo, 4 de janeiro de 2009

A estréia do Chimpanzé

Após várias tentativas frustradas de criar e manter um blog – que sempre esbarraram em minha falta de talento e organização para atualizar periodicamente um espaço dessa natureza -, finalmente decidi levar a empreitada adiante, in fact, como manda o protocolo: escrevendo, postando, interagindo.

Relutei um bocado antes de aderir ao universo do umbigo online, mas, após sopesar as consequencias (o trema caiu, gente!) positivas e negativas dessa incursão, resolvi correr o risco. Portanto aqui vai (já está indo, na verdade) meu primeiro post. Que terá uma razoável gama de ingredientes tão caros aos blogs dedicados à cultura e à reflexão: uma lista com minhas leituras mais relevantes de 2008; uma pequena crônica escrita num distante mês de junho do ano passado; e uma associação fútil e gratuita de cunho (obviamente) pessoal.

Ao trabalho, pois:

Os doze (doze é um número bom) livros que mais me marcaram no ano que passou foram estes:

Pais e Filhos, do russo Ivan Turguêniev;
Memórias do Cárcere, de Graciliano ramos;
Hospício é Deus, de Maura Lopes Cançado;
A Chuva Imóvel, de Campos de Carvalho;
Putas Assassinas, do chileno Roberto Bolaño;
O Despenhadeiro, do colombiano radicado no México, Fernando Vallejo;
Uma Questão Pessoal, do japonês Kenzaburo Oe;
Dentro da Baleia, do inglês George Orwell;
Reparação, do também inglês Ian McIan;
Kafka à Beira-mar, do japonês Haruki Murakami;
Hoje está um dia morto, do André de Leones;
Beijando Dentes, do Maurício de Almeida.

São sete romances, dois livros de contos, dois de memórias, e uma coletânea de ensaios. Tentei ler mais obras de não-ficção, mas falhei terrivelmente. Continuo tarado por romances. Um dado triste: não li nenhum livro de poesia em 2008. Talvez por isso tenha sido um ano tão amargo para mim. Li um livro de reportagem interessante, que havia muito eu cortejava: A Ilha, do Fernando Moraes. Embora um tanto quanto datado – natural em se tratando de reportagem – o livro serve como “porta de entrada” para aqueles que, como eu, se interessam pela revolução, que aliás completa 50 anos este mês.


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Agora segue a crônica:

Procissão

Hoje é um dia atípico de outono: Está quente, mas não muito – agradável às crianças, às plantas e aos pássaros. É também um dia laureado por um halo cor-de-abóbora, por vezes cinza, por vezes rosado. O santo do dia é Santo Antônio, de origem italiana, se não me trai o catecismo. Neste exato momento Santo Antônio de Pádua está sendo carregado num andor através das ruas da cidade por uma centena de fiéis. É um préstito que já presenciei algumas dezenas de vezes. As pessoas entoam cantos litúrgicos e protegem do vento as chamas das velas que carregam. São cerca de cinco quilômetros até o retorno à catedral, onde será rezada uma missa logo em seguida. Há um sentimento de companheirismo acrescido ao de religiosidade que torna mais leve a alma dos caminhantes. Os pés quase não doem; a voz nunca falta. Estão todos enlevados por um espírito de comunhão.

Minhas avós sempre admiraram os jovens que acompanham as procissões e nunca faltam às missas. Aos 9 anos prometi à minha avó materna que nunca deixaria de participar dos rituais da Igreja, entre eles das procissões. Mas o tempo passou, eu fui ficando cada vez mais incrédulo, e acabei me distanciando do catolicismo. Hoje só ouço sermões dentro de casa. E esporadicamente de alguns amigos, sentado à mesa de um bar. A Bíblia eu já não leio. Leio jornais, revistas, artigos na internet, romances, contos, alguma poesia, além de livros de outros gêneros. Não acompanho mais as procissões. Deixei de cumprir minhas promessas. Virei algo semelhante a um fantoche. Acredito que não me permitirão entrar no céu nem no inferno nestas condições, com a alma não periciada e o coração obtuso. Mas quero crer que já tive um passado. Que fui um adolescente de treze anos e um velho de 73. Quero crer que mergulhei de cabeça no fundo do rio, do alto daquela pedra oblonga e algo limosa. Que beijei aquela menina na saída do cinema, e que o fora que ela me deu ainda dói em noites de frio. Quero palpar a carne insensível de minhas cicatrizes. Fazer contato com todos aqueles que se declararam meus amigos algum dia. Desejo que saibam os dias do meu nascimento e do meu suicídio. É que o consumo abusivo de cafeína e os longos períodos de estiagem botam a gente sentimental pra chuchu. Essa combinação também nos enleia com um manto encharcado de sentimento religioso – que no meu caso se traduz em lágrimas coloridas vertidas em razão de melancólicos pores-do-sol.

14/06/2008
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Por fim, descumprirei minha promessa e, para sua felicidade, não farei a tal associação boba e gratuita. Deixarei, contudo, uma frase (ah, as frases!) colhida em algum texto cujo título e a origem agora me fogem.

“O progresso é o desencanto contínuo.”
F. Scott Fitzgerald

Abraços!

Um comentário:

  1. Olá Bruno,
    Acabei esbarrando no seu blog por uma coincidência (coronel vicente miguel, 235): também sou fã do André de Leones.
    Aqui, acabei encontrando uma série de outras: 1) também tenho 24 anos;
    2) Também comecei minha incursão na blogsfera por agora, meu blog deve ter uns quinze dias e
    o layout é igual ao seu.
    Gostei muito da crônica. Vou acompanhar teu blog torcendo pra você ter organização e disciplina, já que talento, pelo que aponta esse seu debut, não é uma coisa que te falta.
    Se puder visite o estranho adão.
    Abraço
    Ronaldo Trindade

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