Está muito calor para ler o jornal. Muito quente para caminhar até a padaria e comprar pães frescos, dois litros de leite, e uma broa de milho. Está muito calor para uma caminhada, para jogar futebol, para ir à igreja, para ir ao cinema. Está quente demais para ficar em casa. Muito quente para passar o dia aqui, no interior do estado. Calor demais para ver televisão, navegar na internet, ler um livro. A canícula está demais para fazer amor. Mas para ir à praia está perfeito - apesar do negrume que se anuncia pelas nuvens gris que vem vindo (do oeste, leste?). E faz trezentos anos ou mais que eu não vou à praia. Que eu não me banho em rio, lago ou cachoeira. Que o pouco cabelo de que disponho não é maltratado pela alta concentração de cloro de uma piscina. Hoje está bom para tomar sorvete, açaí na tigela, caldo-de-cana. Para ouvir música alta. Conversar alto, tomar três latinhas de cerveja ou dois chopes absurdamente gelados. Hoje está perfeito (reitero) para caminhar pela orla da praia apreciando o mulherio, tomando água de coco, afofando a areia molhada com os pés, e um mergulho antes do pôr-do-sol... Um mergulho do qual sairemos renovados de energia e (não há como escapar!) coliformes fecais.
Hoje está quente demais para morrer.
*Cidadezinha qualquer
Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.
Do livro Alguma poesia (1930), de Carlos Drummond de Andrade.
Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.
Do livro Alguma poesia (1930), de Carlos Drummond de Andrade.
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