Semana passada meu chefe me perguntou do que eu menos gostava na vida. Estávamos sozinhos no escritório, ali por volta de meio-dia e meia, e de repente ele parou o que estava fazendo no computador, contornou sua baia e veio na minha direção. Com o mesmo ar enigmático de quem está perto de solucionar um grande mistério, ele me encarou: De que você realmente não gosta? O que mais o aborrece? Surpreendido por aquela pergunta fora de hora e de contexto, refleti durante cerca de vinte segundos antes de responder que o que mais me desagradava era a ignorância. A ignorância das pessoas. Mas essa é uma resposta muito vaga, ele objetou. Durante sua entrevista de emprego você me disse que o que mais o chateava era ter de varrer a casa, ajuntou. Sim, mas na ocasião você indagou qual a tarefa doméstica de que eu menos gostava, justifiquei. Então ele pôs-se em marcha mais uma vez, as mãos ocultas nos bolsos da calça verde-escura e exemplarmente vincada, e só depois de desarmar a expressão insondável que o caracteriza sempre antes de uma abordagem, voltou à carga: Eu não gosto de almoçar sozinho, entende? Isso sim é uma resposta objetiva, direta. Eu não sabia aonde ele queria chegar. Mas insisti na questão da ignorância. Que não suportava pessoas que além de não saber se negam a tomar conhecimento de qualquer coisa. Que tinha ojeriza a intolerâncias de quaisquer espécies. E que perto disso varrer o chão de casa chegava até a figurar como uma tarefa agradável. Entendi. Agora entendi, ele disse por fim, retornando à sua baia e retomando o trabalho no computador que abandonara minutos antes, quando fora acometido por aquela súbita e estranha curiosidade.
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Após esse episódio, lembrei de uma canção de Adriana Calcanhoto, a qual gostaria de compartilhar com vocês e com meu distinto patrão:
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