São raras as vezes em que penso em Deus. Apesar disso, tenho um fundo religioso, uma ânsia de religião. Queria me convencer de que definitivamente tenho uma definição de Deus, um conceito de Deus. Mas não tenho nada semelhante. São raras as vezes em que penso em Deus, pelo simples fato de que o problema me excede tão demasiada e soberanamente, que chega a me provocar uma espécie de pânico, uma debandada geral de minha lucidez e de minha razão. “Deus é a totalidade/’, diz Avellaneda com freqüência. “Deus é a Essência de tudo”, diz Aníbal, “o que mantém tudo em equilíbrio, em harmonia, Deus é a Grande Coerência. Sou capaz de entender uma e outra definição, mas nem uma nem outra são a minha definição. É provável que eles estejam no caminho certo, mas não é desse Deus que necessito. Necessito de um Deus com quem conversar, um Deus em quem possa buscar amparo, um Deus que responda aos meus questionamentos, que suporte as metralhadas das minhas dúvidas. Se Deus é a Totalidade, a Grande Coerência, se Deus não é mais que a energia que mantém vivo o Universo, se é algo tão incomensuravelmente infinito, que importância posso ter para Ele, um átomo tão precariamente alçado a um insignificante piolho de seu Reino? Não me importa ser um átomo do último piolho de seu Reino, mas me importa que Deus esteja ao meu alcance, me importa poder agarrá-lo, não com minhas mãos, claro, nem sequer com meu raciocínio. Importa agarrá-lo com meu coração.
Trecho do romance A Trégua, do uruguaio Mario Benedetti.
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